Flávia Machado
O blog de História, Ciências, Saúde – Manguinhos está coletando visões e opiniões sobre o Programa Mais Médicos, do Ministério da Saúde, que busca suprir com mão-de-obra estrangeira os vazios de assistência na atenção básica da população de centenas de municípios.

Ligia Bahia
Foto: Radis/Ensp/Fiocruz
Para Lígia Bahia, professora do Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o Programa Mais Médicos não enfrenta as desigualdades estruturais em saúde no Brasil. “É hora de se debater a criação de carreiras no SUS para superar o finge que paga e finge que trabalha“, defende Ligia, doutora em Saúde Pública pela Ensp/Fiocruz.
Qual a sua crítica ao Programa Mais Médicos?
Considero que tem o mérito de procurar responder a um dos graves problemas do SUS que é o da interiorização de profissionais de saúde. Mas trata-se de um programa baseado literalmente não apenas em medida provisória, mas também em suportes institucionais provisórios e que procura escapar de fininho do enfrentamento das mazelas estruturais das desigualdades em saúde no Brasil.
O que acha da contratação de médicos estrangeiros, da forma como vem sendo conduzida pelo Governo?
Penso que o cabo de guerra entre governo e entidades médicas é prejudicial à saúde da população. De fato, o preconceito e a xenofobia são inaceitáveis. No entanto, é necessário encontrar uma maneira dialogada para a inserção de profissionais de saúde estrangeiros. Ainda que todos os estrangeiros sejam excelentes profissionais, no médio prazo, a não realização de testes de capacitação os deixará inseguros diante das críticas dos colegas brasileiros.
Acredita que os médicos estrangeiros, principalmente os cubanos, estejam preparados para atuar em nosso país?
Certamente sim. O problema não é de cada médico e sim do sistema como um todo. Como não podemos importar o sistema de saúde cubano, que demonstrou toda sua efetividade, é necessário tratarmos do nosso.
No que o país precisa investir para atrair médicos brasileiros para o interior? O que os afasta atualmente?
Em planejamento regional, para que o país seja menos desigual não apenas em termos econômicos, mas também no se refere à habitação, transportes, educação, cultura e saúde. É necessário que a saúde seja encarada como uma política de desenvolvimento social e não apenas como apêndice de programas focalizados de combate à miséria. Objetivamente é preciso que as universidades se comprometam com a fixação desses profissionais alternando o padrão de recrutamento e formação de estudantes e estendendo suas atividades no sentido do apoio permanente às equipes que trabalham em áreas mais remotas.
Os médicos que se dedicam à carreira pública têm alguma contrapartida com relação à segurança no cargo? O que poderia mudar nesse sentido?
As entidades médicas e de outras profissões de saúde demandam a criação de carreiras no SUS. É hora de voltar a debater o tema com a devida coragem de superar a trágica condição do ‘finge que paga e finge que trabalha’.
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