![Koehler's Medicinal-Plants 1887 Fonte: Wikipedia](http://www.revistahcsm.coc.fiocruz.br/wp-content/uploads/2013/07/folhasdacoca1.jpg)
Ilustração da Erythroxylum coca
no Koehler’s Medicinal Plants – 1887
Fonte: Wikipedia
Mascada ou utilizada em forma de chá, a folha de coca faz parte da cultura ancestral de diversos povos andinos e amazônicos e, em seu estado natural, é aparentemente inofensiva à saúde. Porém, seu cultivo e consumo têm sido reprimidos por governos devido à apropriação da cocaína, seu derivado, pelo narcotráfico.
O artigo “O uso da folha de coca em comunidades tradicionais: perspectivas em saúde, sociedade e cultura“, do psicólogo Ivan Farias Barreto, mestrando do Programa de Pós-graduação em Antropologia da Universidade Federal da Bahia, questiona o sentido e as consequências da criminalização da coca para povos que mantêm as tradições cocaleiras e fazem usos terapêuticos da planta há milhares de anos.
A pesquisa aborda as propriedades básicas da coca, seu uso tradicional e terapêutico, o movimento cocaleiro, o narcotráfico e o posicionamento da Organização Mundial de Saúde sobre a planta. De acordo com o autor, a associação indiscriminada da coca à cocaína e, consequentemente, ao narcotráfico, parte de um preconceito construído historicamente que se sobrepõe às raízes históricas e culturais do uso milenar da planta. Ele também destaca a ineficácia das políticas de criminalização:
“A guerra contra as ‘drogas’ com base no modelo proibicionista completou, em 2012, cem anos de fracasso desde a Convenção Internacional do Ópio, em Haia. Durante esse período, não conseguiram nem reduzir o consumo de substâncias psicoativas tampouco a sua produção. O resultado tem sido percebido no aumento da violência, esquemas de lavagem de dinheiro, tráfico de armas, corrupção etc. A humanidade, por sua vez, sempre fez e fará uso de psicoativos. Além disso, com a constante modernização tecnológica, novas substâncias entrarão no mercado e serão capazes de alterar de formas distintas a percepção, o humor, o comportamento e a consciência. Há que refletir, portanto, no que fazer para enfrentar essa realidade, parecendo razoável pensar em um novo modelo para lidar com a questão das ‘drogas’.”
Barreto defende a criação de uma legislação específica que estimule o uso racional dessa planta, absorvendo por completo todo o plantio legalizado para a indústria farmacêutica, sem deixar margens para a comercialização ilegal, e ao mesmo tempo garantindo a preservação dos costumes das comunidades que utilizam a coca.
A seu ver, cabe à psicologia, como ciência, romper o silêncio frente às questões indígenas e compreender a dinâmica dos processos socioculturais desses povos. “A psicologia, em um contexto multidisciplinar, apresenta sua contribuição tanto para reformulação de políticas públicas sobre a legalização do uso da folha de coca no Brasil quanto para ações voltadas à atenção em saúde mental das populações indígenas”, afirma.
Para ele, psicólogos que atuam no Sistema Único de Saúde (SUS) precisam estar preparados para lidar com questões culturais como o uso da folha de coca em rituais religiosos por diversos povos indígenas no alto do rio Negro e poderão contribuir com intervenções quando comunidades tiverem sua identidade ameaçada. “Esses profissionais encontram-se diante de um campo de atuação emergente, no qual são convidados a considerar e respeitar as particularidades de cada comunidade indígena, sendo provocados a formular novas estratégias na promoção da saúde”, conclui.
Texto em português | resumo em inglês
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Imagem da capa: A flor da coca por H. Zell. Fonte: Wikipedia